Aparências... E mais aparências. (conto)



          Me lembro como se fosse ontem, mesmo podendo mesmo ter sido ontem, e nos dias anteriores, em ocasiões que já se repetiram e que provavelmente se repetirão. Não meço as malditas palavras, não as encho de rebuscamento, de "frescuras", para falar do grupo de amigos cuzões que tem um estilo particular e atemporal: Aqueles em que você não deveria deixar com sua filha chegasse muito perto -apesar de algumas vezes parecer o contrário, não culpamos vocês - parecidos tirados de um filme ruim qualquer dos anos oitenta e que fazem parecer tudo fluir tão bem em meio às merdas em que estivessem metidos.

          Não espero que adivinhe meu nome - e nem de onde venho. Ele poderia ser Jhon, Kin, Rodrigo, Joseph... E poderia ter vindo de qualquer lugar em qualquer década pós 60's e de qualquer bairro fodido, onde tenha aquele pessoal no qual você não deveria deixar que sua irmã chegasse muito perto, o pessoal que quando se reunia sempre ficava de olho em quem iria abrir a mochila primeiro - já que todos usávamos mochilas não somente para ir estudar, ou para trabalhar, mas em qualquer lugar - e ver o que trazia de "interessante", na expectativa de que a camaradagem fosse cumprida, para que na próxima vez outra pessoa do grupo retorne o ato. E sempre tinha-se boas surpresas. Na verdade as surpresas sempre se tornavam melhores depois de algumas horas.

          Claro que todos éramos muito bem apessoados, sempre carregando perfumes e sabonetes  (até mesmo colírio, se necessário) nas mochilas. Tínhamos sempre de esconder o quão fodidos estávamos - esteja fodido, se necessário, mas que seja por dentro. Evidente que nossa amizade era tamanha que compartilhávamos de tudo, afinal, fizemos há tempos - não me lembro ao certo quando - o laço que decidia qual função cada vagabundo leitor frenético de filosofia, que tinha sempre cheiro de fumaça misturado ao perfume e ao hálito de chicletes, iria desempenhar, que instrumento ele iria adotar, para carregar sempre consigo, assim como sua boa e velha mochila fedorenta.

          O fato é que não se sabia se o clima era de alegria ou tristeza. Tudo parecia sempre muito ameno para nós, mesmo com toda aquela agitação e questionamentos corriqueiros sobre o que realmente estávamos fazendo. O importante é que todos estávamos no mesmo embalo. Estávamos igualmente fétidos. Estávamos tentando alcançar metas inviáveis, mas isso não interessava muito, pois tínhamos com o que nos motivar quando os ânimos baixavam, quando a criatividade nos sugava para um buraco negro.

          Sempre que caminhávamos até os locais onde tudo acontecia, lembrávamos com carregada nostalgia dos lugares onde já tínhamos passado; das personalidades intrigantes e inconfundíveis que havíamos conhecido do início da empreitada, lembrávamos que talvez aqueles caras, em quem confiávamos sem ao mesmo termos contato direto, tivessem passado pelas mesmas experiências. E todos sabiam que aquilo tudo era um vislumbre do que havíamos gradativamente trilhado para parecer menos que alguns fodidos da classe média. Assim chegávamos novamente ao destino, onde tudo acontecia tão insignificantemente para o mundo exterior, tão escondido, que nos questionávamos se era mesmo real - mesmo tendo a noção que de que ali, não importava se aquilo era real para os outros, já que no mundo exterior deixava momentaneamente de existir. Sabíamos, no fundo, que era mais que era... Tudo aquilo iria se repetir milhares de vezes.    

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