O meu uivo (poesia)


 Imagem de divulgação (Schütz, Willian S. - Insânia Mundana, Chagas Edições, 2018).

Todos os meus semelhantes
uivam
ao meu redor.
Estão fodidos das cabeças.
O mundo
e a vida
estupraram
seus os cérebros
e gozaram
insanidade.

Estão todos loucos.
Os sãos são doentes.
Os poetas suicidas,
que acabaram com as próprias vidas
secando os seus sacos em banheiros
de manicômios,
previram isso há mais de cinquenta anos.
Todos uivaram.
Os loucos que hoje uivam
uma loucura tão palpável
que quase parece saudável
emulam
um sentimento antigo.
Não se sabe o que é,
mas se sabe que existe.
Se sabe que todos transam
consigo
mesmos;
Que todos transam com todos;
Que todos tragam algo;
Que todos só se importam com inutilidades,
pois as utilidades
já se tornaram inúteis.
Todos são tão impressionantemente...
Tão confusamente...
Sedutores,
que outras pessoas,
desconhecidas
caem de amores
por essas filosofias
autodestrutivas/e/questionáveis.
TODOS UIVAM PEDINDO SOCORRO!
SOMOS CÓPIAS DOS OUTROS...
SOMOS CÓPIAS DE NÓS MESMOS!
OS MAIORES INTELECTOS
MATAM-SE
ANTES DE SEREM DESCOBERTOS!
OS QUE SOBREVIVEM,
PEDEM SOCORRO
ATRAVÉS DE UM CORO
ARTÍSTICO
DE UIVOS GGAGOS.
Escritores não sabem o motivo
de serem escritores;
músicos, pintores, bêbados,
locutores de rádio, bombeiros,
putas que não cobram, enfermeiros,
assassinos, fuzileiros, fazendeiros,
jogadores profissionais,
vendedores de jornais...................................
.....................................................................
não sabem o motivo para serem o que são.
simplesmente são.
Foram colocados ali?
São peças de um joguinho?
É lindo.
É enlouquecedor.
É melhor nem querer saber.
Quem quer, uiva.
Quem não quer, geme.
Mas todo mundo
no mundo
come, bebe, dorme (...)
Mas nem todos vivem.
E todos morrem.
Alguns envelhecem antes de ficarem velhos.
Alguns dos meus amigos
- e digo
por experiência
própriiiiia -
cedo ou tarde
enlouquecem.

Talvez seja para ser assim.
Talvez o mundo nem exista.
Talvez "ser" signifique "não ser".
"Ser ou não ser?": a velha questão
do dramalhão
"Ser" alguma coisa, talvez signifique
"não ser" outra.
Talvez ser louco
signifique não ser como qualquer outro:
que espera a morte invés de ir até ela
olhando, aproveitando, curtindo
e registrando o caminho.
Quem se perde nessa, uiva
gritos desafinados de socorro
que só enfraquecem
quando não atendidos.
E quando atendidos,
todo o desespero que passara
parece, por fim, não ter feito
muito sentido... como quase tudo.
Os cultos enlouquecem.
Todos são.
Uns mais, outros menos...
O que diferencia uns dos outros
é a importância dada
para a foda
do dia seguinte.

É bom cultivar prazeres
quando se está fodido das ideias.
É bom viver
tentando esquecer
que a vida é a vida
e que a morte é a morte.
Conseguir isso completamente
seria uma grande sorte.
Viver cantando, uivando, vibrando
e essas coisas todas sem sentido algum...
sem nem tentar achar um sentido.
É bom viver vivendo.
E morrer?
Só morrendo para saber. 

Poesia retirada do livro Insânia Mundana, publicado em 2018 pela editora Chagas Edições. 

 O retrato de uma juventude que clama por socorro. Com sua essência homenageando a genialidade do beat Allen Ginsberg, porém acrescentando a identidade, opinião e estilo característico presentes na obra de Willian S. Schütz, a poesia retrata a angústia dos jovens que sofrem calados com toda a "Insânia Mundana". Um pedido de ajuda, um urro, um relato de quem viu e vê a insanidade de perto - regando versos que claramente referenciam uma bagagem literária repleta de autores que discorreram e versaram visões das juventudes de suas épocas. Versos longos e quase desesperados em um fluxo enlouquecido de consciência - talvez a poesia que melhor represente a insânia mundana.

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